A votação da medida já vigente acabou emperrando
Votação da MP que institui o programa de parcelamento de débitos de empresas foi atrelada à aprovação de bônus para auditores da Receita Federal
Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli, O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA – A equipe econômica retomou nesta quinta-feira, 25, as negociações com parlamentares para definir o texto da nova Medida Provisória (MP) do Refis (parcelamento de dívidas tributárias). Esse texto deve substituir a MP 766, que instituiu o programa original e só vale até 1.º de junho.
A votação da medida já vigente acabou emperrando depois que sua aprovação foi atrelada à aprovação de outra MP, a 765, que criava um bônus para os fiscais da Receita. Com a ameaça de paralisação dos auditores em meio à crise política, os parlamentares usaram o bônus como moeda de troca por mais concessões no Refis.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, até aceitou um pagamento menor de entrada para o parcelamento, de 20% para 7,5%, para avançar no acordo, apesar disso representar perda de arrecadação para o governo em 2017. Mesmo assim, as lideranças resistiram.
O bônus acabou não sendo aprovado e os auditores fazem desde ontem uma espécie de “paralisação branca” para pressionar a equipe econômica, ampliando a crise na Receita. Pela proposta em análise na Câmara, o dinheiro para financiar o bônus virá de um fundo composto das multas que forem aplicadas a contribuintes em autuações fiscais.
Muitas lideranças da base governista não queriam aprovar a criação de bônus com receio de incentivar uma “indústria de multas” justamente num momento em que as empresas passam por grandes dificuldades financeiras devido à recessão prolongada do País, segundo apurou o Estadão/Broadcast, que acompanhou ao longo da noite de anteontem as negociações no Congresso. Já os auditores defendem o bônus para aumentar a fiscalização e a arrecadação.
Novo texto. O impasse, que avançou até a madrugada de quinta-feira, levou Meirelles a ficar mais de três horas tentando, ao lado do secretário da Receita, Jorge Rachid, e de lideranças do governo fechar um acordo para definir as regras do novo Refis antes da votação da MP do bônus.
O deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), relator da MP do Refis, se reuniu ontem com Meirelles para rediscutir os termos do novo texto. Na prática, as negociações foram reabertas em praticamente todos os principais pontos, desde prazo até forma de pagamento. Os deputados continuam questionando a entrada de 7,5%, por exemplo. Cardoso Jr., no entanto, admitiu que é preciso garantir a entrada de recursos para a União neste ano.
O relator afirmou ainda que os valores dos descontos também estão sendo rediscutidos. O acordo de anteontem previa, depois da entrada, pagamento à vista, em janeiro de 2018, com descontos de 25% nos encargos, 40% das multas e 90% nos juros. Outra opção seria o parcelamento em 150 meses, com descontos de 25% nos encargos, 50% na multa e 80% nos juros. “Existe expectativa de alguns parlamentares de alterar isso (descontos)”, disse.
A edição de uma nova MP do Refis foi a alternativa viável diante de impossibilidades técnicas, apontadas por deputados, para a votação do texto da forma como havia sido acordado com a área econômica. Em troca, a MP do bônus seria apreciada na sessão de ontem, já que seu prazo de validade está próximo de terminar. O problema é que apenas uma parte do acordo foi cumprido. O texto-base da MP do bônus foi aprovado, mas faltando um destaque. Justamente o que garantiria a sua forma de financiamento: por meio das multas. No momento dessa votação, a sessão acabou caindo por falta de quórum.
BASTIDORES: Tensão marcou conversas sobre o Refis
Para tentar salvar a Medida Provisória 766, do Refis, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, passou a tarde e a noite da quarta-feira em negociação com parlamentares. Primeiro, teve de transferir seu gabinete para fora da Esplanada dos Ministérios, tomada pelos protestos. Depois, instalou-se no gabinete da liderança do governo no Congresso, de onde só saiu pouco antes da meia-noite, após admitir que não seria mais possível votar a MP.
Passava das 22h desta quarta-feira, 24, quando o líder do governo na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), entrou atarantado na liderança, empunhando uma versão recém redigida da MP. Ainda na recepção, ao ver o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia, e o secretário da Receita, Jorge Rachid, disse em voz alta que o texto era inviável, levando em consideração o regimento da Casa. Isso porque o acordo duramente costurado ao longo do dia continha pontos que não estavam nem no texto original da MP, nem nas emendas apresentadas pelos parlamentares.
O imbróglio durou horas. Por causa disso, Meirelles acabou cancelando de última hora sua participação no Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic), depois de pedir um adiamento de três horas de sua palestra. Perto das 22 horas, os organizadores chegaram a anunciar aos empresários que integravam a plateia que Meirelles estava a caminho, antes de anunciar o cancelamento.
O entra e sai na sala da liderança do governo foi intenso. “Os deputados estavam desconfortáveis em votar o bônus por causa da multa”, contou um assessor do Palácio do Planalto. Pela medida, a concessão de bônus ficaria atrelada à quantidade de multas que os auditores aplicassem. Para o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Sindifisco), Claudio Damasceno, a categoria já foi remunerada pela sistemática do bônus na década de 90 e início dos anos 2000. “E não se tem registro de nenhum tipo de excesso (na aplicação de multas).”
Fonte: Fenacon / O ESTADO DE S.PAULO – Por: Adriana Fernandes e Idiana Tomazelli